Havia uma mulher que desenvolveu uma gravidez imaginária. Sentia o bebê se mover em seu ventre há quatro meses. No médico para o pré-natal: nada no ultrassom, nenhum batimento cardíaco. Encaminhada ao psiquiatra, descartou os tais remédios que, segundo o Google, prejudicariam o seu bebê. Num torpor onírico, aguardava o parto sem ansiedade. Desentendera-se com o pai do rebento, que se negara à conclir o quartinho, o teto, coalhado de estrelas fosforescentes. A criança chutava como um jogador de futebol: o enxoval todo em blue, segura de ser um menino. Isolada no 708, gerava a cria à revelia da ciência, de Deus, da covid 16. O chá de bebê a distância, realizado pelas poucas amigas. Presentes aportavam via correio. Um móbile de bichinhos desinfectado com álcool em gel emitia luzes coloridas e sonidos de carrossel. A circunferência da barriga atrapalhava na hora de passar as fraldinhas que com ternura repousavam ao lado dos sapatinhos de tricô (tecidos e retecidos por ela), em três gavetas. A montagem do armário concluída sozinha, após arrebentar a mão do eterno noivo com um martelo. Fora difícil remover o sangue dos ursinhos de pelúcia. Engraçado é que nunca tinha sonhado em ser mãe. Mas desde a pandemia, a dispensa do emprego, o basta no noivado, os vídeos de autoajuda em looping, a maternidade a tomara inteira, preenchia desvãos. Sua vida, de fato, nunca fora tão significativa. Sentia-se cada dia mais forte e confiante. Estava certa de que seria uma mãe excepcional. Que filho não teria todo orgulho do mundo de ter ela como mãe? Os dezessete anos sobrevividos no abrigo. A espera frustrada, o sufocado rancor, a angustiada resignação. Às vezes, duvidava um tanto de si, mas acariciando o ventre, como descrer do filho que nascia em si? Sim, ele poderia contar incondicionalmente com ela. Ela nunca nunca nunca o abandonaria. Seria a mãe mais perfeita que podia conceber. A mãe sonhada, aquela que nunca tivera para amar ou que um dia a amara.
Tricotando casaquinhos de lã, esperava a bolsa romper.
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