segunda-feira, 22 de junho de 2020

VERÃO (incompleto)

Havia um homem que ficou ilhado com a família numa ilha. As férias tinham sido planejadas com um ano de antecedência. O pacote contemplava hospedagem num resort magnífico. Sua esposa sonhara desde adolescente com o Caribe. Gabo era seu escritor predileto. Mas a epidemia que veio era outra. Fechou fronteiras e impôs quarentena. Eles, que não eram dali, se viram súbito confinados no luxuoso hotel. Os aeroportos fechados, o possível colapso do sistema de saúde, da economia. As notícias vinham de longe, enfermos na Ásia, frigoríficos carregados de mortos na Itália. Incuráveis, os ricaços partiram em saveiros, jatinhos particulares. As passagens da família, parceladas em vinte vezes, o voo cancelado sem previsão. Acabaram os cinco ali.

Num deserto de almas, cadeiras de praias tostavam ao sol. Os sócios do hotel não queriam problemas com turistas. Dentro do prejuízo inestimável, eles representavam centavos. Liberaram-lhes o pacote mais caro. Passavam o dia mergulhados na piscina de fundo infinito, já cansados da transparência surreal das águas onde peixinhos beliscavam as pernas. Eram servidos com drinks coloridos por um exército. O ex-proprietário holandês tivera problemas com o sindicado local. Se não podia dispensá-los, que os funcionários cumprissem as funções no lockdown: zero risco de contaminação, zero a possibilidade de processos.

Empreendedores pensam cifras, números, algarismos. Sabiam o valor de cada uma das seis estrelas. O circuito interno de câmeras garantiria que todas as funções fossem executadas. Depois de anos de invasão corsárias, a ancestralidade guerreira degenerara para uma mortiça forma de resignação.

As crianças se entediaram na segunda semana umas com as outras. Metidas nos salões vazios, brincavam de pega-pega num labirinto de caça-níqueis. A esposa tostada de sol e das máquinas de raio U.V.A. engordava visivelmente. Dormiam na suíte presidencial, sem hora para despertar. Os funcionários que os receberam com entusiasmo, já não se esmeravam em simulações. Mês e meio passado, o serviço começou a decair. Os pratos chegavam mornos à mesa. A banda de reggae parecia entorpecida. Os coquetéis que sorviam aos litros, perderam um tanto da cor. Seguranças, camareiras e arrumadeiras vagavam sonâmbulos por corredores ser disfarçar o vetado uso dos celulares. 

25 minutos de espera na sala de massagem ao som do merengue, ele enviou um email indignado à gerência. Que culpa tinha sua família do caos global? Dispostos em forma de pelotão, desculparam-se humilhados no salão principal. Advertidos, fizeram-se profissionais e distantes, como autômatos. Parecem civilizados, mas no fundo conspiram, pensou o homem.

A conexão por satélite garantia a fluidez das lives. Eram invejados pelos amigos, deslumbrados pelo fundo azul. Eles simulavam a alegria das selfies. Os empregados conspiram, em papiamento, na cozinha.
A mulher ficou presa na sauna. O termostasto altíssimo, ninguém soube explicar. Novo email à gerência, fez com que abrissem o salão de beleza e tiveram a barba feita, o cabelo cortado, a tinta refeita, as unhas da esposa com francesinha. Ela, que arranhava o espanhol, soube que a manicure era da etinia kxua. As filhas ficavam com a avó. O marido era o segurança antes bonachão, que adquirira um ar sisudo, desde que o marido quisera sair de lancha para o mergulho aquático entre tubarões. Sentia falta das crianças. A avó era meio cega. Levou-a para ver seu altar com a virgem, que parecia mais uma índia kxua, dessas que pedem sacrifício. Através de chantagem, ele conseguiu uma boa quantidade de marijuana com um funcionário jamaicano. Um curto circuito, comunicaram, deixou interditado o bar do hotel. Uma pane na rede tornou a internet instável. Tiveram que desabilitar o circuito interno de câmeras, que ficou à espera do técnico, isolado por suspeita de covid. As crianças tinham ataques de fúria se recusavam a obedecer. As discussões com o marido, apesar do seu torpor, eram cada dia mais violentas. Dali a um mês sentia-se num filme de Kubrick. Apesar dos geradores, uma pane detonou os frigoríficos. O cheiro de podre de lulas, ostras, lagostas e lagostins empestavam os corredores. Foram aconselhados a permanecerem dentro do hotel, pois as feras exóticas, livres das celas eletrônicas, estraçalhara uma garçonete no jardim. Notícias vinham da tevê de mortos.

Incomodava-a os olhares, encontrara amendoim na muqueca do filho que já informara alérgico. A menina estava febril, não de gripe, e se aborrecida com o esposo, para quem tudo estava ótimo. De óculos escuros e bermudas floridas, contemplava Dickenson bay, enquanto esposa atravessava corredores puxando o filho fratura exposta. Irritou-se com o alarme eletrônico que parecia não funcionar. Num passado nem tão remoto receberiam chicotadas se ignorassem o soar da sineta do senhor. Só deu pelo sumiço da esposa quando não conseguiu encontrar a droga do carregador do celular. Vagou pelos corredores banhados de sol e foi encontrar os funcionários reunidos no quarto da manicure, ajoelhados em volta da santa. Embora uniformizados com o logo do hotel, haviam regredido à natureza tribal, e já não se comunicavam em língua civilizada. Buscou a esposa, o caçula, a menina e os filhos nos exóticos bangalôs  construídos com retalhos saídos da imaginação de roteiristas ianques de filme b. Os altofalantes tocavam de los guagos. exclusivamente construídos para turistas. Então encontrou as quatro covas na areia voltadas para cuxco e uma quinta, justo para cabe-lo. Cinco e não seis, como as estrelas do hotel. Mas seriam suficientes para aplacara a fúria dos deuses, espantar a peste, e abrir novamente a comunicação para as ilhas.

Anos de sistemática submissão ou terror, se a servidão os enlouqueceram, ou se insubmissos, se rebelavam agora contra o capital sem nome, talvez não acreditassem de fato que aquele sacrifício saciaria a fome dos deuses esquecivos das Antilhas o da longe africa, cuja santeria se misturava, derrubando a peste. O certo é que não havendo turistas, não haveria por que ainda estarem à serviço do hotel.


Reciocínio numérico. Hibisco e buganvílias Dickenson bay
Exóticas suítes lobby

Suits com mordomo

Cricketers pubs
Subserviência remunerada
Festas caribenhas


mas conspiravam em grupos, entre hibiscos e buganvílias a realidade mágica da cólera de Gabo..


































Havia um homem que ficou ilhado com a família no Caribe. As férias tinham sido planejadas com um ano de antecedência. O pacote contemplava hospedagem num resort magnífico nas antilhas. Sua esposa sonhara desde adolescente com a realidade mágica de amor e cólera de Gabo. Mas a epidemia que veio era outra. Fechou fronteiras e impôs quarentena. Eles que não eram dali se viram súbito confinados no luxuoso hotel. Os aeroportos fechados, o possível colapso do sistema de saúde da economia, notícias vindas da Ásia, frigoríficos carregados de mortos na Itália. Incuráveis, os ricaços partiram em saveiros, jatinhos particulares. As passagens da família, parceladas em vinte vezes, o voo cancelado sem previsão. Acabaram os cinco ali.
Num deserto de almas, cadeiras de praias tostavam ao sol. Os sócios do hotel não queriam problemas com turistas. Dentro do prejuízo inestimável, eles representavam centavos. Liberaram-lhes o pacote mais caro. Passavam o dia mergulhados na piscina de fundo infinito, já cansados da transparência surreal das águas onde peixinhos beliscavam as pernas. Eram servidos com drinks coloridos por um exército de funcionários. O ex-proprietário holandês tivera problemas com o sindicado local. Se não podia dispensá-los, que cumprissem as funções no lockdown. Zero risco de contaminação, zero a possibilidade de processos. Sabiam o valor de cada uma das seis estrelas. Empreendedores pensam cifras, números, algarismos. O circuito interno de câmeras garantiria que todas as funções fossem executadas. Depois de anos de invasão corsárias, a ancestralidade guerreira degenerara para uma forma macia de resignação. As crianças se entediaram na segunda semana umas com as outras. Metidas nos salões vazios, brincavam de pega-pega num labirinto de máquinas de caça níquel. A esposa tostada de sol e das máquinas de raio UVE, engordara visivelmente. Dormiam na suíte presidencial, sem hora para despertar. Os funcionários que os receberam com entusiasmo, já não se esmeravam em simulações. Mês e meio passado, o serviço começou a decair. Os pratos chegavam mornos à mesa. A banda de reggae parecia entorpecida. Os coquetéis que sorviam aos litros, perderam um tanto da cor. Seguranças, camareiras, arrumadeiras e xxxx vagavam sonâmbulos por corredores ser disfarçar o vetado uso dos celulares.  25 minutos de espera na sala de massagem ao som do merengue, ele enviou um email indignado à gerência. Que culpa tinha sua família do caos global? Dispostos em forma de pelotão, desculparam-se em uníssono diante da família no salão principal. A advertência devolveu profissionais e distantes, como autômatos.

Advertida a equipe, tornaram a de maneira civilizada, mas conspiravam em grupos, entre hibiscos e buganvilias. A conexão remota permitiam lives num infinito fundo azul. Eram invejados e sorriam da sorte. Os empregados conspiram na cozinha em papiamento. A esposa ficou presa na sauna. Ninguém soube explicar a temperatura altíssima do termostato. Com um email para gerência, fez com que abrissem o salão de beleza e tiveram a barba feita, o cabelo cortado, a tinta refeita, as unhas da esposa com francesinha. Ela, que arranhava o espanhol, sou que a manicure era da etinia kxua. As filhas ficavam com a avó. O marido era o segurança antes bonachão, que adquirira um ar sisudo, desde que o marido quisera sair de lancha para o mergulho aquático entre tubarões. Sentia falta das crianças. A avó era meio cega. Levou-a para ver seu altar com a virgem, que parecia mais uma índia kxua, dessas que pedem sacrifício. Através de chantagem, ele conseguiu uma boa quantidade de marijuana com um funcionário jamaicano. Um curto circuito, comunicaram, deixou interditado o bar do hotel. Uma pane na rede tornou a internet instável. Tiveram que desabilitar o circuito interno de câmeras, que ficou à espera do técnico, isolado por suspeita de covid. As crianças tinham ataques de fúria se recusavam a obedecer. As discussões com o marido, apesar do seu torpor, eram cada dia mais violentas. Dali a um mês sentia-se num filme de Kubrick. Apesar dos geradores, uma pane detonou os frigoríficos. O cheiro de podre de lulas, ostras, lagostas e lagostins empestavam os corredores. Foram aconselhados a permanecerem dentro do hotel, pois as feras exóticas, livres das celas eletrônicas, estraçalhara uma garçonete no jardim. Notícias vinham da tevê de mortos.
Incomodava-a os olhares, encontrara amendoim na muqueca do filho que já informara alérgico. A menina estava febril, não de gripe, e se aborrecida com o esposo, para quem tudo estava ótimo. De óculos escuros e bermudas floridas, contemplava Dickenson bay, enquanto esposa atravessava corredores puxando o filho fratura exposta. Irritou-se com o alarme eletrônico que parecia não funcionar. Num passado nem tão remoto receberiam chicotadas se ignorassem o soar da sineta do senhor. Só deu pelo sumiço da esposa quando não conseguiu encontrar a droga do carregador do celular. Vagou pelos corredores banhados de sol e foi encontrar os funcionários reunidos no quarto da manicure, ajoelhados em volta da santa. Embora uniformizados com o logo do hotel, haviam regredido à natureza tribal, e já não se comunicavam em língua civilizada. Buscou a esposa, o caçula, a menina e os filhos nos exóticos bangalôs  construídos com retalhos saídos da imaginação de roteiristas ianques de filme b. Os altofalantes tocavam de los guagos. exclusivamente construídos para turistas. Então encontrou as quatro covas na areia voltadas para cuxco e uma quinta, justo para cabe-lo. Cinco e não seis, como as estrelas do hotel. Mas seriam suficientes para aplacara a fúria dos deuses, espantar a peste, e abrir novamente a comunicação para as ilhas.
Anos de sistemática submissão ou terror, se a servidão os enlouqueceram, ou se insubmissos, se rebelavam agora contra o capital sem nome, talvez não acreditassem de fato que aquele sacrifício saciaria a fome dos deuses esquecivos das Antilhas o da longe africa, cuja santeria se misturava, derrubando a peste. O certo é que não havendo turistas, não haveria por que ainda estarem à serviço do hotel.


Reciocínio numérico. Hibisco e buganvílias Dickenson bay
Exóticas suítes lobby

Suits com mordomo

Cricketers pubs
Subserviência remunerada
Festas caribenhas

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