Havia um homem que ficou ilhado com
a família numa ilha. As férias tinham sido planejadas com um ano de
antecedência. O pacote contemplava hospedagem num resort magnífico. Sua esposa sonhara
desde adolescente com o Caribe. Gabo era seu escritor predileto. Mas a epidemia
que veio era outra. Fechou fronteiras e impôs quarentena. Eles, que não eram
dali, se viram súbito confinados no luxuoso hotel. Os aeroportos fechados, o
possível colapso do sistema de saúde, da economia. As notícias vinham de longe,
enfermos na Ásia, frigoríficos carregados de mortos na Itália. Incuráveis, os
ricaços partiram em saveiros, jatinhos particulares. As passagens da família,
parceladas em vinte vezes, o voo cancelado sem previsão. Acabaram os cinco ali.
Num deserto de almas, cadeiras de
praias tostavam ao sol. Os sócios do hotel não queriam problemas com turistas.
Dentro do prejuízo inestimável, eles representavam centavos. Liberaram-lhes o pacote
mais caro. Passavam o dia mergulhados na piscina de fundo infinito, já cansados
da transparência surreal das águas onde peixinhos beliscavam as pernas. Eram
servidos com drinks coloridos por um exército. O ex-proprietário holandês
tivera problemas com o sindicado local. Se não podia dispensá-los, que os
funcionários cumprissem as funções no lockdown:
zero risco de contaminação, zero a possibilidade de processos.
Empreendedores pensam cifras,
números, algarismos. Sabiam o valor de cada uma das seis estrelas. O circuito
interno de câmeras garantiria que todas as funções fossem executadas. Depois de
anos de invasão corsárias, a ancestralidade guerreira degenerara para uma mortiça
forma de resignação.
As crianças se entediaram na
segunda semana umas com as outras. Metidas nos salões vazios, brincavam de
pega-pega num labirinto de caça-níqueis. A esposa tostada de sol e das máquinas
de raio U.V.A. engordava visivelmente. Dormiam na suíte presidencial, sem hora
para despertar. Os funcionários que os receberam com entusiasmo, já não se
esmeravam em simulações. Mês e meio passado, o serviço começou a decair. Os
pratos chegavam mornos à mesa. A banda de reggae parecia entorpecida. Os
coquetéis que sorviam aos litros, perderam um tanto da cor. Seguranças,
camareiras e arrumadeiras vagavam sonâmbulos por corredores ser disfarçar o
vetado uso dos celulares.
25 minutos de espera na sala de
massagem ao som do merengue, ele enviou um email indignado à gerência. Que
culpa tinha sua família do caos global? Dispostos em forma de pelotão,
desculparam-se humilhados no salão principal. Advertidos, fizeram-se profissionais
e distantes, como autômatos. Parecem civilizados, mas no fundo conspiram,
pensou o homem.
A conexão por satélite garantia a
fluidez das lives. Eram invejados pelos amigos, deslumbrados pelo fundo azul. Eles
simulavam a alegria das selfies. Os empregados conspiram,
em papiamento, na cozinha.
A mulher ficou presa na sauna. O
termostasto altíssimo, ninguém soube explicar. Novo email à gerência, fez com
que abrissem o salão de beleza e tiveram a barba feita, o cabelo cortado, a
tinta refeita, as unhas da esposa com francesinha. Ela, que arranhava o
espanhol, soube que a manicure era da etinia kxua. As filhas ficavam com a avó.
O marido era o segurança antes bonachão, que adquirira um ar sisudo, desde que
o marido quisera sair de lancha para o mergulho aquático entre tubarões. Sentia
falta das crianças. A avó era meio cega. Levou-a para ver seu altar com a
virgem, que parecia mais uma índia kxua, dessas que pedem sacrifício. Através
de chantagem, ele conseguiu uma boa quantidade de marijuana com um funcionário
jamaicano. Um curto circuito, comunicaram, deixou interditado o bar do hotel.
Uma pane na rede tornou a internet instável. Tiveram que desabilitar o circuito
interno de câmeras, que ficou à espera do técnico, isolado por suspeita de
covid. As crianças tinham ataques de fúria se recusavam a obedecer. As
discussões com o marido, apesar do seu torpor, eram cada dia mais violentas. Dali
a um mês sentia-se num filme de Kubrick. Apesar dos geradores, uma pane detonou
os frigoríficos. O cheiro de podre de lulas, ostras, lagostas e lagostins
empestavam os corredores. Foram aconselhados a permanecerem dentro do hotel,
pois as feras exóticas, livres das celas eletrônicas, estraçalhara uma
garçonete no jardim. Notícias vinham da tevê de mortos.
Incomodava-a os olhares, encontrara
amendoim na muqueca do filho que já informara alérgico. A menina estava febril,
não de gripe, e se aborrecida com o esposo, para quem tudo estava ótimo. De
óculos escuros e bermudas floridas, contemplava Dickenson bay, enquanto esposa
atravessava corredores puxando o filho fratura exposta. Irritou-se com o alarme
eletrônico que parecia não funcionar. Num passado nem tão remoto receberiam
chicotadas se ignorassem o soar da sineta do senhor. Só deu pelo sumiço da
esposa quando não conseguiu encontrar a droga do carregador do celular. Vagou
pelos corredores banhados de sol e foi encontrar os funcionários reunidos no
quarto da manicure, ajoelhados em volta da santa. Embora uniformizados com o
logo do hotel, haviam regredido à natureza tribal, e já não se comunicavam em
língua civilizada. Buscou a esposa, o caçula, a menina e os filhos nos exóticos
bangalôs construídos com retalhos saídos
da imaginação de roteiristas ianques de filme b. Os altofalantes tocavam de los
guagos. exclusivamente construídos para turistas. Então encontrou as quatro
covas na areia voltadas para cuxco e uma quinta, justo para cabe-lo. Cinco e não
seis, como as estrelas do hotel. Mas seriam suficientes para aplacara a fúria
dos deuses, espantar a peste, e abrir novamente a comunicação para as ilhas.
Anos de sistemática submissão ou
terror, se a servidão os enlouqueceram, ou se insubmissos, se rebelavam agora
contra o capital sem nome, talvez não acreditassem de fato que aquele
sacrifício saciaria a fome dos deuses esquecivos das Antilhas o da longe africa,
cuja santeria se misturava, derrubando a peste. O certo é que não havendo
turistas, não haveria por que ainda estarem à serviço do hotel.
Reciocínio numérico. Hibisco e
buganvílias Dickenson bay
Exóticas suítes lobby
Suits com mordomo
Cricketers pubs
Subserviência remunerada
Festas caribenhas
mas conspiravam em grupos, entre
hibiscos e buganvílias a realidade mágica da cólera de Gabo..
Havia um homem que ficou ilhado com
a família no Caribe. As férias tinham sido planejadas com um ano de
antecedência. O pacote contemplava hospedagem num resort magnífico nas antilhas.
Sua esposa sonhara desde adolescente com a realidade mágica de amor e cólera de
Gabo. Mas a epidemia que veio era outra. Fechou fronteiras e impôs quarentena.
Eles que não eram dali se viram súbito confinados no luxuoso hotel. Os
aeroportos fechados, o possível colapso do sistema de saúde da economia,
notícias vindas da Ásia, frigoríficos carregados de mortos na Itália. Incuráveis,
os ricaços partiram em saveiros, jatinhos particulares. As passagens da
família, parceladas em vinte vezes, o voo cancelado sem previsão. Acabaram os cinco
ali.
Num deserto de almas, cadeiras de
praias tostavam ao sol. Os sócios do hotel não queriam problemas com turistas.
Dentro do prejuízo inestimável, eles representavam centavos. Liberaram-lhes o pacote
mais caro. Passavam o dia mergulhados na piscina de fundo infinito, já cansados
da transparência surreal das águas onde peixinhos beliscavam as pernas. Eram
servidos com drinks coloridos por um exército de funcionários. O ex-proprietário
holandês tivera problemas com o sindicado local. Se não podia dispensá-los, que
cumprissem as funções no lockdown. Zero risco de contaminação, zero a
possibilidade de processos. Sabiam o valor de cada uma das seis estrelas. Empreendedores
pensam cifras, números, algarismos. O circuito interno de câmeras garantiria
que todas as funções fossem executadas. Depois de anos de invasão corsárias, a
ancestralidade guerreira degenerara para uma forma macia de resignação. As
crianças se entediaram na segunda semana umas com as outras. Metidas nos salões
vazios, brincavam de pega-pega num labirinto de máquinas de caça níquel. A
esposa tostada de sol e das máquinas de raio UVE, engordara visivelmente.
Dormiam na suíte presidencial, sem hora para despertar. Os funcionários que os
receberam com entusiasmo, já não se esmeravam em simulações. Mês e meio
passado, o serviço começou a decair. Os pratos chegavam mornos à mesa. A banda
de reggae parecia entorpecida. Os coquetéis que sorviam aos litros, perderam um
tanto da cor. Seguranças, camareiras, arrumadeiras e xxxx vagavam sonâmbulos
por corredores ser disfarçar o vetado uso dos celulares. 25 minutos de espera na sala de massagem ao
som do merengue, ele enviou um email indignado à gerência. Que culpa tinha sua
família do caos global? Dispostos em forma de pelotão, desculparam-se em
uníssono diante da família no salão principal. A advertência devolveu profissionais
e distantes, como autômatos.
Advertida a equipe, tornaram a de
maneira civilizada, mas conspiravam em grupos, entre hibiscos e buganvilias. A
conexão remota permitiam lives num infinito fundo azul. Eram invejados e
sorriam da sorte. Os empregados conspiram na cozinha em papiamento. A esposa
ficou presa na sauna. Ninguém soube explicar a temperatura altíssima do
termostato. Com um email para gerência, fez com que abrissem o salão de beleza
e tiveram a barba feita, o cabelo cortado, a tinta refeita, as unhas da esposa
com francesinha. Ela, que arranhava o espanhol, sou que a manicure era da
etinia kxua. As filhas ficavam com a avó. O marido era o segurança antes
bonachão, que adquirira um ar sisudo, desde que o marido quisera sair de lancha
para o mergulho aquático entre tubarões. Sentia falta das crianças. A avó era
meio cega. Levou-a para ver seu altar com a virgem, que parecia mais uma índia
kxua, dessas que pedem sacrifício. Através de chantagem, ele conseguiu uma boa
quantidade de marijuana com um funcionário jamaicano. Um curto circuito,
comunicaram, deixou interditado o bar do hotel. Uma pane na rede tornou a
internet instável. Tiveram que desabilitar o circuito interno de câmeras, que
ficou à espera do técnico, isolado por suspeita de covid. As crianças tinham
ataques de fúria se recusavam a obedecer. As discussões com o marido, apesar do
seu torpor, eram cada dia mais violentas. Dali a um mês sentia-se num filme de
Kubrick. Apesar dos geradores, uma pane detonou os frigoríficos. O cheiro de
podre de lulas, ostras, lagostas e lagostins empestavam os corredores. Foram
aconselhados a permanecerem dentro do hotel, pois as feras exóticas, livres das
celas eletrônicas, estraçalhara uma garçonete no jardim. Notícias vinham da
tevê de mortos.
Incomodava-a os olhares, encontrara
amendoim na muqueca do filho que já informara alérgico. A menina estava febril,
não de gripe, e se aborrecida com o esposo, para quem tudo estava ótimo. De
óculos escuros e bermudas floridas, contemplava Dickenson bay, enquanto esposa
atravessava corredores puxando o filho fratura exposta. Irritou-se com o alarme
eletrônico que parecia não funcionar. Num passado nem tão remoto receberiam
chicotadas se ignorassem o soar da sineta do senhor. Só deu pelo sumiço da
esposa quando não conseguiu encontrar a droga do carregador do celular. Vagou
pelos corredores banhados de sol e foi encontrar os funcionários reunidos no quarto
da manicure, ajoelhados em volta da santa. Embora uniformizados com o logo do
hotel, haviam regredido à natureza tribal, e já não se comunicavam em língua
civilizada. Buscou a esposa, o caçula, a menina e os filhos nos exóticos
bangalôs construídos com retalhos saídos
da imaginação de roteiristas ianques de filme b. Os altofalantes tocavam de los
guagos. exclusivamente construídos para turistas. Então encontrou as quatro
covas na areia voltadas para cuxco e uma quinta, justo para cabe-lo. Cinco e
não seis, como as estrelas do hotel. Mas seriam suficientes para aplacara a
fúria dos deuses, espantar a peste, e abrir novamente a comunicação para as
ilhas.
Anos de sistemática submissão ou
terror, se a servidão os enlouqueceram, ou se insubmissos, se rebelavam agora
contra o capital sem nome, talvez não acreditassem de fato que aquele
sacrifício saciaria a fome dos deuses esquecivos das Antilhas o da longe africa,
cuja santeria se misturava, derrubando a peste. O certo é que não havendo
turistas, não haveria por que ainda estarem à serviço do hotel.
Reciocínio numérico. Hibisco e
buganvílias Dickenson bay
Exóticas suítes lobby
Suits com mordomo
Cricketers pubs
Subserviência remunerada
Festas caribenhas
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