segunda-feira, 19 de julho de 2021

ABANDONO

Havia uma mulher que abandou os filhos. Moravam os três no apartamento. Desde a morte do marido não se reconhecia. Amava os filhos, so nao suportava mais aquela vida. Fez as malas, apanhou os documentos e partiu. A de dezesseis leu o bilhete para o menor. A mae deixara o cartão com a pensão do pai que deveriam sacar e quitar compromissos. Havia outras instruções, precisas para cada situação. Todas anotadas com objetividade como a última: não me preocurem. Viveram as 5 fases do luto. No terceiro, mês desistiram de achar que voltaria. O menino, que tinha medo de fantasmas, procurava refúgio  na cama da irmã, a quem se apegara ainda mais, temendo que partisse. A menina vestia a blusa esquecida pela mãe no cesto de roupas sujas, acendia um cigarro e soltava fumaça na janelinha da lavanderia. Chorava no chuveiro às vezes. As contas no débito automático, do aluguel. A escola pública não exigia mensalidades. O orçamento era apertado. Ela conciliava estudos com serviço não registrado numa lanchonete. Era assediada diariamente, mas seguia firme. Apesar disso, aceitava cartões de engravatados, vai saber do futuro.

Contrariando clichês, o menino ia bem na escola. A morte do pai alicercara o homem que seria. O abandono da mãe nada mais fizera que confirmar que ele e a irmã eram sobreviventes. À beira da morte, aos 37, se lembraria daquele dia e decidiria viver. O sentido-aranha dela, a faria ligar nas impensáveis três e trinta da manhã. Por hora, era um menino num prédio solitário. A amizade com o jornaleiros garantia acesso a tirinhas. U

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